Em umas destas tardes de outono
em que a chuva dominava a sonoridade do lado de fora e não restava mais ninguém
além de mim em casa, coloquei um cd no aparelho de som e deitei-me no chão frio
do meu quarto. Fechei os olhos e tomei posse daquele momento. A música
adentrava em meus ouvidos e me fazia esquecer-se da chuva, das pessoas, das
obrigações. Não sei qual foi o momento exato, mas eu entrei em contato com a
minha alma e, como se tivesse em terapia, refleti sobre quem eu sou. Engraçado
como nestes momentos sempre passa um flash
back de momentos da minha infância que me levaram a ser quem sou hoje. O mistério sempre foi um dos meus melhores
passatempos e eu adorava conhecer e analisar tudo ao meu redor. Aquela era o
momento propício para mais um mergulho na obscuridade do “se entender”.
A música calma terminou e logo
veio uma mais agitada. Era a voz de Laura Pausini a cantar “Con la musica em la
rádio”, uma das minhas canções preferidas. E em meio ao entendimento e
reflexão, pude ouvir passos a se chocarem contra o piso. A movimentação me fez
abrir os olhos e se deparar com a minha imagem a dançar ao som do refrão,
tentando alcançar a mesma afinação da cantora. A imagem era um pouco menos
sólida e eu podia ver através dela. Estava de olhos fechados e ia de um lado
para o outro como quem é dominada pela sintonia entre o corpo e a música. Até
que “aquela eu” abre os olhos e sorri enquanto continua a dançar. Eu não estava
assustava, apenas queria entender por que estava vendo a mim mesma, por que não
podia ouvir mais o som da chuva, por que não podia ser normal como toda a
sociedade.
- Não é legal ser como todos os
outros, acredite! A loucura que é o lado divertido desta vida. – responde o meu
eu enquanto continuava a dançar.
Ela podia ouvir meus pensamentos,
é claro. Aquela sua resposta sempre foi comum me vir a mente e eu acreditava
plenamente nela. Pus-me em um diálogo um tanto incomum enquanto se sentava na
cama e acompanhava com os olhos o meu dançar desajeitado. Chegou ao fim àquela
canção e começou outra, um pouco mais calma e eu, ela, minha alma continuava a
dançar. Comecei a pensar nas outras pessoas, nos seus romances, nas suas vidas.
Desde a minha infância eu já me sentia diferente, a solidão era a única
companheira das noites sofridas, e folhas em branco eram preenchidas de
lágrimas traçadas em versos de uma sonhadora. Eu só queria uma canção dedicada,
um amor simples, a alegria de uma casa cheia de crianças a derrubarem objetos e
distraírem a mim.
- Não queira ser normal. Milhares
de pessoas chegam e logo se vão sem ao menos entender o sentido disso tudo,
anexadas a uma monotonia que não as permite parar para pensar e perceber que é
uma loucura viver. Seus empregos, a correria, o buscar incansável de uma
velhice tranquila. Passam todos os dias pelas mesmas ruas movimentadas, a
reclamar do transito, da vida, do cansaço, exigem o máximo de si mesmas e não
se dão ao luxo de parar um pouco e perceber que aquelas ruas passam paralelas a
um mar calmo, frio e de espumas relaxantes. Você já consegue molhar os joelhos
neste mar como ninguém. Quem te olha nos olhos não sabe do que se passa do lado
de dentro e por isso podem até pensar que você é louca... Quando isso acontecer,
sorriremos e agradeceremos juntas, pois a nós coube ser diferente e compreender
este mistério que rege a humanidade.
Aquela minha imagem nem se quer
movera os lábios, eu havia ouvido tudo aquilo dentro da minha própria mente. Aos
poucos a imagem foi se transparecendo até restar apenas eu novamente. Por mais que
em todas as outras vezes eu tenha sofrido, no fundo eu sempre soube que não
queria ser como os demais. Queria mesmo ser louca de entender e tirar proveito
disso. Levantei-me, e no último refrão daquela música me pus a dançar, naquela
sintonia harmoniosa entre a alma do mundo e a minha.
Ana Paula Ribeiro
Ser como todo mundo realmente não é legal. Ser louca hoje em dia é um previlégio, pelo menos para mim é. Ser louca, imaginar coisas, se ver em varios lugares e etc. Ser louca o suficiente para conversar com você mesma e se conhecer ao fundo. Bem, isso é para poucos.
ResponderExcluirImaginei a sensação de deitar no chão gelado, me fez lembrar quando eu fazia isso. Amei o texto! Você escreve muito bem.
Beijos,
Monique <3
http://www.secretsofalittlegirl.com/
Eu me identifiquei tanto,mas tanto com seu texto que chego a me assustar. De vez em quando acontece essas conversas entre eu e eu mesma, minha alma, não sei, ás vezes eu preciso parar para pensar, para me entender e acabo falando comigo mesma, sem ao menos abrir a boca. E acontece isso enquanto ouço uma música, ou vejo um filme ou mesmo estou escrevendo.
ResponderExcluirSer diferente sempre foi a minha sina, minha qualidade, meu defeito, digo isso por que em alguns momentos não queria ser diferente dos demais, já em outros agradecia por ser, enfim, seu texto expressa o que penso também, ser diferente é bom e precisamos aproveitar isso, por que a maioria não é assim, e nem ao menos conversar consigo mesmas para tentar entender a elas mesmas, elas conseguem ;}
Gostei muito mesmo do seu texto e do blog em si *O*
Beijos
http://mon-autre.blogspot.com.br/
Nossa, esse texto é lindo *o*, e o pior se encaixa no meu eu como se fosse eu mesma que o tivesse escrito.
ResponderExcluirGostei muito do seu texto, mesmo !
Beijos.
http://doseadolescente.blogspot.com.br/
Gostei muuito do texto. Concordo com ele, não é legal ser como todo mundo.
ResponderExcluirSeu texto me lembrou aquela frase conhecida do Bob Marley, sabe? "Vocês riem de mim por eu ser diferente, e eu rio de vocês por serem todos iguais".
Beijo
http://semquerermeintrometer.blogspot.com/
Acho que todo mundo vai se encaixar nem que seja um pouquinho com o seu texto... Faz parte da nossa vida, faz parte do que somos. Todos temos alguma coisa pra mostrar ao mundo e isso nos faz ser diferentes. Amei seu texto, beijos
ResponderExcluirhttp://primeirapessoa-dosingular.blogspot.com.br/
Essa cena me fez pensar o quanto você se pareceu comigo por uns instantes. Já vi tantas de mim, quando o mundo tá uma exaustão, quando todo mundo tem pressa e eu não, quando eu nem sei quem sou, ou porque sou. Mas digo-lhe, Ana, é vendo pessoas como você que eu me sinto bem em ser assim, parecido contigo - para dentro. Não liga pra quem tá fora não, eles são superficiais demais. Ah, e antes que eu esqueça o principal, que jeito tão lindo foi esse de contar essa história, hein? Tiro o chapéu pra ti. Extremamente bem feito e sentido. Beijos Ana querida, e a torcida do lado de cá é recíproca, e totalmente verdadeira.
ResponderExcluirBeijos, Bia.
Texto muito show!
ResponderExcluirPS. parabéns pelo seu blog.
Te convido a conhecer o meu,
http://carmasepalavras.blogspot.com/
;)
É como dizem por aí: só os loucos são felizes \o/
ResponderExcluirTambém entro em diálogos comigo mesma, geralmente antes de dormir.
Acho incrível quando saímos um pouco do comum e damos espaço á loucura, e lá encontramos uma imensa paz.